quarta-feira, 31 de janeiro de 2007
Oi...
Inquestionável: a arte nos torna mais gostosos, mais amáveis (nos dois sentidos). Nos humaniza, sensibiliza, nos melhora, e como tudo isso traz companhia, amigos e amor, a gente pode ficar menos deprimido.
Nas férias que tirei de mim mesmo -- e de vocês -- vi o DVD ‘Eu, você e todos nós’. Há um personagem central, uma artista plástica, que usa sua desenvolvidíssima capacidade de se expressar pra catar um namorado e cavar uma exposição. A convivência com a arte nos ajuda a cantar melhor: tanto as canções, quanto as paqueras. Tomara-oxalá, as pessoas, as instituições e as escolas pratiquem cada vez mais Arte.
E trabalho pesado para os robôs! Quem sabe Domenico di Masi tenha razão sobre os robôs e o tempo que vai sobrar pra gente: ócio e contemplação. E quem sabe ele tenha razão sobre isto também: o mais importante –- os amigos, a família, a contemplação da arte e da natureza –- ainda é grátis.
Mais ou menos, né? Mas realmente é ainda mais barato do que comprar coisas fútei-pífias na Daslu (que não vende só porcaria, claro, oficorçe, aliás, quem me dera umas freqüentadinhas... concretas). Mas bem mais grátis do que esse monte de perfumaria que nos impingem como o mapa à felicidade. Semelhantes meus, estou cada vez mais budista quanto a isto: carro importado, iate, jatinho particular, restaurantes carézimos, amantes, grifes, botox, lipo, silicone, essa coisarada toda de gente podre (literalmente) de rica, quando a alma lhes é pequena, só lhes traz fantasia e ilusão. E como dizia Paulo Francis, citando não sei quem (quem souber, que me ilustre, por favor), 'realidade é melhor do que sonhos'.
Também nas férias, ouvi pela primeira vez, e depois cantei um monte, a canção ‘Daughter and father’ (‘Filha e pai’), de Paul Simon. Morri de inveja, queria ter escrito para meu filhoca Jerônimo. Olha aí uma tradução livre:
‘Se você acordar assustada no meio de um pesadelo e, por uma fração de segundo, não se lembrar de onde está, mantenha a calma, abra a janela e deixe suas lembranças voltarem para os campos, lá na montanha onde a gente contava as estrelas cadentes. Tenho certeza de que a luz que brilha em você vai brilhar para sempre e, embora eu não possa garantir que não haja um bicho papão embaixo de sua cama, eu vou montar guarda, como no cartão postal do cão de guarda amarelo, e não vou embora até você voltar a dormir e sonhar um sonho lindo. Vou seguir seu brilho, acompanhar seu crescimento, vou pintar um cartaz para que você sempre saiba, tanto quanto um e um são dois, que nunca haverá um pai que ame sua filha mais do que eu amo você. Confie em sua intuição, é como pescar: você joga a linha e espera a fisgada. Mas não precisa gastar seu tempo pensando em grana. Tente ajudar a raça humana, que luta para sobreviver à sua mais terrível noite.’
Postei, esses dias, duas frases do Pi como omaggio ao meu querido amigo, mas também pra manifestar que não aceitei bem o fato de que ele e a Mi não participarão do blog, como os três tínhamos planejado. Eles estarão por perto, mais o Pi do que a Mi (uma doida que vive mundo afora atrás de aventuras): ele é psiquiatra, psicanalista e artista, portanto, tem tudo a ver com depressão e fama.
Achamos melhor que eu seguisse à frente, na vertente iniciada na Folha Online, como uma sua vergôntea (essa você vai ter que olhar no dicionário. Omaggio, não precisava dizer, mas é homenagem, em italiano: sei lá por que, l'Italia stà a martellare con furore la mia testa oggi).
Vou 'desenhando' o blog e escrevendo os primeiros posts ainda sem a coragem necessária pra divulgá-lo. Sinto a coceirinha, mas acuso o medo.
Sabe quando se fica um tempão longe de um quase-amigo e quando o reencontra a conversa não flui? A gente não sabe se o outro ainda é o mesmo, se a gente ainda é o mesmo para o outro, e toda essa série de angustias típicas do depois dos longos silêncios. Pois tô assim.
Com amigo mesmo, isso não acontece, né? Um dos sintomas de amizade verdadeira é justamente encontrar-se depois de anos e sentir como se a última conversa tivesse sido ontem.
Mas será que meus quase-amigos Sonia, a poeta, Ramon, o revisor amoroso, Hildegard, a holandesa voadora, Anita, a irritada, Guilherme, o grande comentador de colunas, a Minha amiga petista, Dani-Hell, o blogueiro infernal (que se bandeou para os lados do PodCast), a Mulher deprimida, Regina Rheda, a escritora brasileira radicada nos EUA e já famosa a esta altura, os Amigos inteligentes da turma do Ramon, Sir Livio, Mr Nr, Rodrigo, o deprimido, Ferfari, a que me rejeitou, Samantha é um gênio, Wágner Mangueira (eu te dei um subtítulo?), Oriana, a petista esclarecida, e todos os outros leitores, que se tornaram significante-ativos, ainda são os mesmos? E será que ainda significo para eles?
Citando sem consultar a 'velha' correspondência, não me lembro de todos... quem garante que se lembrem... hoje, quando se é preciso explodir metrô pra chamar a atenção... ainda mais que mudei de sobrenome... o cara nem fixa uma marca e já muda pra outra... (mas quem leu uma das colunas antigas, talvez se lembre do numerólogo que afirmou que Hermelino Mantovani é um nome tão poderoso quanto Pelé, que a sominha das letrinhas dá o mesmo numerinho poderosão. Já pensou se é verdade, o tempo que perdi? Mas não acredito. Só comecei a achar bonitinho o Hermelino perto do Mantovani, apesar de carcamano pra caramba, e da desconfiança por italianos que meu pai inoculou em mim. Como ele pôde fazer isso com esta pobre criança? Ainda bem que aprendi a amar Rossini, Nino Rota, Ennio Morricone, Fellini, Humberto Eco, Italo Svevo, Monica Bellucci -- Persephone em Matrix 2 --, e aqueles juízes que enfrentaram a máfia. Não vou dizer que amo Michelangelo e Leonardo, que é brega, ma che gli amo, si, gli amo. E nem acho o Domenico di Masi tão kitsch assim).
Se mandar o blog, espero mandar bem. E tomara-oxalá, os leitores que esqueci de citar e que já se sentiam personagens da coluna, reclamem com ira santa e a raiva devida a sua volta à fama que o blog lhes proporcionará. Afinal, depressão é raiva interiorizada, como dizia a analista de 'Os Sopranos'. O Pi e o Khir concordam.
Bota a raiva pra fora e bota a fama... pra fora também.
(Bota não é bota em italiano...)
Fim das férias, beginning of the blog and of some new fears. Novidade é sempre bom, até medo novo é melhor do que medo velho.
Vocês ainda estão aí, não estão, meus irmãos? Semelhantes meus?
terça-feira, 23 de janeiro de 2007
Segunda postagem, a primeira foi uma foto sem cores vivas
Um dia, nas férias de janeiro de 2005, numa praia chuvosa, escrevi o primeiro texto da coluna ‘Diário, depressão e fama’, publicada durante 464 dias na Folha Online (talvez o texto, ‘Praia com chuva’, ainda se ache na rede. Procurei e não encontrei).
Hoje, em casa, longe do mar (pena) e da areia (graças a Deus), não chove, mas há duas coisas em comum com aquele dia: é janeiro e estou deprimido pra caramba. Depressão imobiliza, me impõe ao lar, não componho nem continuo o romance que comecei ('Duas putas não bastam'), e dificulta o trabalho cotidiano, aquele que traz dinheiro pra casa. Só tem uma vantagem: dá vontade de comunicar a própria depressão. Algo como uma necessidade de chorar as pitangas com outros no mesmo estado. De consolar e de ser consolado.
Mobiliza procurar os irmãos, semelhantes meus.
Deprê, cumpro malemá as tarefas do dia-a-dia, e apenas quando tenho companhia. Como criança que precisa de papai, mamãe ou babá para fazer a lição de casa. Mesmo assim -– só acompanhado -–, é melhor que nada: dá pro sustento. E pra pagar a análise. Sozinho, fico na cama. Mas hoje, milagre, resolvi escrever. Escrever, consigo. Sozinho. Às vezes.
A análise é a única coisa boa que posso me proporcionar atualmente. Fora isso, não saio de casa nem que a vaca tussa e vá pro brejo. Às vezes, um amigo ou amiga vem me salvar e levar ao cinema. E meu filhoca também, quando quer ir ao Parque da Mônica. Ele está com 5 anos e meio e outra atividade nossa é lutar Pokemón: os dele são Butterfree, Celebi, Mew, e outros que esqueci. Os meus são Pikachu, Snorlax (o pokemón mais deprê da face da terra dos pokemóns: dorme o dia inteiro), Psyduck, Squittle e os poderosíssimos Unows (se é assim que se escreve). Ele chamou nosso desenho (acima) de 'O mundo em trevas salvo por pokemóns luminosos'. São pokemóns originais, de lavra familiar.
Nas nossas batalhas, ele ganha sempre, pois não aceita perder. Estou tentando ensiná-lo a perder. É tarefa difícil para um pai deprimido, que já se sente um perdedor. Mas: melhor um perdedor do que 'a winner' no sentido yuppie e rasteiro de filmes americanos e shoppings iguatemis (putz, mencionar yuppie equivale a dizer gumex, ou seja, mostrar a certidão de nascimento, revelar a idade). Quando foi mesmo que aqueles engomadinhos-gumex reinaram, antes de Tom Wolfe acabar com eles?
Quase desisti do blog. E, para dizer a verdade, isso aqui é um rascunho. Ainda nem sei se publico.
Como ia dizendo, a análise é o melhor que consigo fazer por mim no momento. Tenho um analista dez: Khyr. A gente só aprende merda fazendo análise. Tudo aquilo que não quer nem olhar, quanto mais ver. Vejo que não sou nada parecido com o que gostaria. E que só é possível ser como se é. É foda, ou melhor, não é foda, pois foda é coisa boa.
Sabe o pintor de ‘Contos de Nova York’, que tem que se envolver em relações amorosas doentias para produzir suas obras? Sabe o vendedor de armas de ‘O Senhor das Armas’ e o vendedor de cigarros de ‘Obrigado por Fumar’, que trabalham nisso apenas porque "sou bom nisso"? Pois é, esses caras lograram encontrar energia para viver, e até produzir riqueza e fama, alimentando-se de ações política e eticamente incorretas. Estou encontrando o meu caminho, também incorreto. Mas ainda não consigo aceitá-lo.
Se conseguir, a primeira providência será trocar o termo ‘neurose’ por ‘singularidade’. É mole, para quem foi criado numa família classe média baixa católica, em Ourinhos, SP? Cresci nas décadas de 50 e 60, pô!
Meus irmãos, semelhantes meus, eis um dinossauro. Estou em extinção. Ainda bem que meu filho gosta de dinossauros, além de pokemóns.
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